É-me muito difícil entrar numa livraria e não sair de lá com nenhum livro. 🙂 A minha última compra, mais por impulso, foi um livro pequenino, muito fácil e agradável de ler, com algumas words of wisdom de um tal Paul Arden: “It’s not how good you are, it’s how good you want to be“. Apesar de ser um livro brotado da área da publicidade, usando dela referências e histórias, é realmente uma boa metáfora para o mundo dos negócios, como dizem na contracapa (a primeira metade do livro é mais liberta da associação ao sector da advertising). Gostei e recomendo.
Entre uma série de conselhos, uns já interiorizados e aprendidos (sabe sempre bem some validation!), outros que me fizeram pensar noutras coisas e perspectivas, alguns provocam um reboot mental. 🙂
Duas secções que fizeram click comigo foram as das páginas 64 à 67. E percebi que tenho que agir e apresentar-me como aquilo que quero ser, e não necessariamente como aquilo que sou agora. É isso que pushs things forward and gets us there, where we want to be, being what we want to be.
Isto a propósito de cartões de visita, perfis em sites de redes sociais, páginas de about, etc, inscrições em eventos, etc. Para mim é sempre complicado decidir o que escrever. O que sou? O que faço?
Há pessoas que se apresentam referindo a sua formação académica tradicional (ex.: Eng. Bioquímico). Outros que a omitem ou não especificam (ou não têm) e que listam outros tipos de cursos ou formações mais ligeiras, alternativas ou de nicho (ex.: formado em agricultura biológica). Muitas pessoas mencionam aquilo que fazem actualmente, ou que fizeram mais recentemente (ex.: Técnico de Laboratório). Algumas pessoas referem as suas skills, sem menção a certificações ou acreditações “oficiais” (até porque para muitas actividades e conhecimentos, não as há) (ex.: especialista em Ervas Aromáticas). Há quem se apresente como fazendo ou sendo aquilo que, efectivamente, ainda não faz ou é, mas pretende vir a fazer ou ser (ex.: consultor em produção biológica de ervas aromáticas). Outros levam as coisas mais à letra e descrevem a sua condição ou função corrente literal (ex.: estudante de mestrado).
Chateia-me não saber o que escrever quando me inscrevo num evento qualquer. Acabo por escrever “empresária”, à falta de melhor. Mas isso soa-me sempre a alguém tipo “patrão”, que tem uma ou mais empresas, e para enriquecer (não só para “viver delas”), mas não necessariamente a trabalhar nelas. 😛 And that is sooo far from truth no meu caso.
Vendo no dicionário:
empresário
aquele que tem ou dirige uma empresa;empresa
empreendimento;
tarefa que alguém se determina a executar;
cometimento ousado;
associação organizada que, sob a direcção e responsabilidade de uma pessoa ou de uma sociedade, explora uma indústria, um ramo de comércio ou outra actividade de interesse económico;
os que dirigem ou administram essa associação;
Eu sinto-me essencialmente como alguém que tem uma tarefa, que dirige uma investida ousada. 🙂 Mas o “ter uma empresa” não me define (posso ser sócia em mais que uma e não desempenhar nenhuma tarefa nesse âmbito, ser apenas um investimento). E o “dirigir uma empresa” não esgota aquilo que sou, faço e tenho competências ou capacidade para fazer no contexto dessa empresa ou doutra. Nomeadamente, eu não me limito a dirigir uma empresa, ou sou a empresa, o meu trabalho é a empresa, pelo que a descrição “empresária” falls too short.
“Lic. em Química/Biotecnologia pela FCT-UNL” não me serve de nada, não é nessa área que eu trabalho nem que quero trabalhar, e tal menção servirá apenas para encher o olho a algumas pessoas, porque tal afirmação transporta consigo a credibilidade de que a instituição desfruta, e porque significa que eu tive a oportunidade de beneficiar de formação “superior” (diz, geralmente, algo da minha família e não de mim) e tive capacidade para a concluir com aprovação. But it doesn’t mean a thing, além de atestar a minha perseverança e capacidade de dedicação e empenho (on a good day), e talvez revelar um interesse em ciência e um provável pensamento analítico.
Frequentar e concluir um curso não significa automaticamente que se perceba alguma coisa do assunto, ou que se seja bom a usar aquilo numa profissão subsequente. Formação “superior” não implica necessariamente pessoas melhores ou mais competentes. Simplesmente podem ter reunido mais alguma bagagem, mas nada nos garante que tenham olhado verdadeiramente para ela, que a tenham usado para construir uma bagagem própria, nova.
Quantos melhores-alunos-da-turma vocês conhecem que tenham acabado por tornar-se aquilo que geralmente os outros lhes vaticinam (pessoas muito bem sucedidas na vida, geralmente implicando cargos importantes e ordenados gordos)? E quantos dos outros, e particularmente dos mais baldas ou underachievers se revelaram pessoas bem sucedidas nesse e noutros aspectos?
A menção à formação académica visa validar-nos por algo que fomos capazes de fazer no passado para algo que fazemos ou queremos fazer agora, e que não tem nada a ver, frequentemente, mesmo que seja na mesma “área”. Obter mais formação académica é algo que pondero há alguns anos. Uma ideia recorrente é um MBA, “verde”, de preferência, para procurar corrigir o meu handicap nessa área. Numa fase em que andava mesmo muito interessada na construção sustentável (arquitectura bioclimática, materiais eco-friendly, eficiência energética, etc, etc) ponderei estudar arquitectura (a minha primeira opção para o Ensino Secundário, depois desviada para as ciências exactas) para poder trabalhar naquilo. Entretanto envolvi-me cada vez mais nestas questões do planeamento urbano e da mobilidade e gostava de aprofundar mais esta área, nomeadamente no que concerne aos modos suaves. Frequentar um curso académico serviria para duas coisas: expandir e interligar (hopefully) os meus conhecimentos informais, e validá-los (ter alguém a dizer “sim senhor, fulana tal foi avaliada nestes tópicos e foi aprovada”), algo que não acontece neste momento. Contudo, a oferta pós-graduada nesta área no nosso país parece-me praticamente inexistente… Bom, no fundo o que eu queria era ganhar mais insight das áreas tradicionais de onde vêm as pessoas que decidem as coisas por cá (arquitectura, engenharia,…), naquilo que envolve e joga com a parte que eu conheço (empiricamente, em auto-didactismo, por todas as palestras com especialistas e técnicos a que assisto, por todos os livros, artigos, blogs e afins que leio e analiso).
Na onda do Paul Arden, tenho que me re-inventar. O meu problema, crónico, é que nunca acho que sei o suficiente de nada, nem que sou suficientemente competente e reliable a fazer algo para poder dizer de mim que “sei bastante disto” ou “faço isto bem”. Quanto mais sei, mais sei que há mais para saber e para relacionar com o que já conheço ou sei. 🙂 Como tenho uma rede de interacções sociais muito limitada, é-me difícil situar-me porque tenho pouca oportunidade de me ver na situação de ser comparada e comparar-me com outros. E depois, as pessoas gostam de construir muralhas e palacetes em torno dos seus galões e achievements, com nomes pomposos, fatos janotas, “protocolos” formais e discursos herméticos. O resultado é que quem está de fora cria grandes expectativas, e tende a olhar “os especialistas” como pessoas muito sábias, muito inteligentes, muito conhecedoras e infalíveis na sua especialidade. Independentemente de isso ser assim ou não (and humans are only humans, even if great humans). Isso é negativo se a pessoa for realmente “um especialista”, and a good one, porque intimida os outros restringindo a interacção e o enriquecimento mútuo em conhecimentos e experiências, mas pode ser ainda pior se não for, mas simplesmente projectar essa imagem nos outros, porque tal imagem conferirá às suas opiniões uma credibilidade que elas podem não ter, e serão aceites como verdades indisputadas independentemente da sua qualidade. Isto para dizer que me é difícil ver-me um dia a apresentar-me como “especialista” (pessoa que se ocupa exclusivamente de um ramo particular de uma ciência, de uma arte, etc. ; perito.), “perita” (experimentado; que tem perícia; hábil; versado; douto; sabedor) em alguma coisa, mesmo que o seja na prática. O problema é que se quero sê-lo trabalhando como tal tenho que me saber vender como tal. Tenho, em suma, que ter lata para projectar uma imagem de mim própria que eu não considero exacta, mesmo que seja precisa (e a Química revela-se… 😉 ).
A experiência da faculdade ensinou-me uma coisa fundamental: o trabalho é parte da vida, e nesta devemos fazer aquilo que nos dá prazer, que nos suscita interesse, construir aquilo que sonhamos, bater-nos por aquilo em que acreditamos, conviver com quem gostamos. Só temos uma vida, e a felicidade (a sua busca e o seu desfrute) deve fazer parte dela. E isso não é coisa para um hobby ou mesmo um part-time. Passamos a maior parte dos nossos dias, da nossa vida, no “trabalho”, convivendo com outras pessoas nesse contexto profissional. Nesse sentido, dividir a nossa vida em “trabalho” e “vida pessoal” não faz sentido, uma ideia que vi pela primeira vez verbalizada no livro “Nunca almoce sozinho” do Keith Ferrazzi (que também recomendo) e que faz todo o sentido para mim. People are people, no matter in what contex you deal with them. The values that rule your life have no reason to be differently applied in “personal” or “professional” context. Para mim o meu trabalho não pode ser só uma maneira de pagar as contas, tem que ser algo que me realize, que me permita crescer e expandir, que me dê gozo fazer, cuja obra me dê orgulho. E se há algo assim to start with, o mais natural é querermos fazê-lo durante mais tempo, pelo que faz todo o sentido integrá-lo no nosso trabalho de todos os dias and get people to pay us to do what we would do for free if somehting or someone took care of our bills. 😉
I’m into bicycles as transportation (and leisure, and fun!), I’m into urban planning for livable cities. I’m into sustainability. I’m into… 🙂
Agora tenho que reflectir um pouco sobre “how I want to be perceived” in order to get payed work doing what people perceived like that get hired to do. While maintaining a realistic light on things (well, on myself) and still only promising what I can deliver, but believing I can deliver. Not an easy nor simple task.
Pingback: Resoluções de ano novo at b a n a n a l o g i c
Gostei muito do post e também recomendo os livros referidos pois tenho ambos e já os li e reli.
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Boa sorte in selling yourself!
Obrigada, Nídia. 🙂
A consciência dessas questões é já uma prova de sabedoria. Por vezes há questões que não têm respostas certas ou erradas, a sabedoria é saber formular e viver a questão em si. A vida, e em especial a nossa, é uma teia de percepção difícil de ser vista de fora por quem está dentro. Estes posts revelam valores elevados: a capacidade de ser verdadeira e fiel a conceitos de vida. Isso é uma matriz de certeza que permite definir o modo de actuar: fazer brilhar essa chama interior perante a Vida e os Outros, é o desafio a concretizar sempre.
Votos de Bom 2009!
🙂 Obrigada, Miguel. Bom ano!